SP: réus alegam ter confessado morte de Celso Daniel 'sob tortura'
O promotor Marcio Friggi disse que a morte de Celso Daniel foi encomendada após a descoberta de um plano do prefeito de acabar com as fraudes em licitações e outros desvios de verba
Foto: Diogo Moreira/Futura Press
Foto: Diogo Moreira/Futura Press
Os três réus julgados nesta quinta-feira pela morte do então prefeito de Santo André, Celso Augusto Daniel (PT), em 2002, disseram nesta quinta, em interrogatório no Fórum de Itapecirica da Serra, na Grande São Paulo, ter confessado a participação no crime sob tortura. Ivan Rodrigues da Silva, o Monstro; Rodolfo Rodrigo dos Santos Oliveira, o Bozinho; e José Edison da Silva falaram que assinaram os seus depoimentos sem ler mediante forte coação policial.
O julgamento começou por volta das 11h30 de hoje. Ivan alegou que estava no Paraná no momento do crime e os outros dois réus deram álibis como uma viagem à Bahia e o trabalho como borracheiro. Os advogados de Itamar Messias dos Santos Filho e Elcyd Oliveira Brito, o John, abandonaram o plenário - após ter frustrada a tentativa de desmembrar o julgamento - e serão julgados apenas no dia 16 de agosto.
O julgamento, que acontece no Fórum de Itapecirica da Serra e tem previsão de terminar nesta sexta, teve início com a escolha dos sete jurados: quatro homens e três mulheres. Como as 13 testemunhas de defesa foram dispensadas pelos advogados, a audiência começará pelo interrogatório dos três réus.
ChoquesIvan afirmou ter assinado 10 folhas de depoimento sem ler. Ele afirma que, a cada vez que pedia para ler o que estava prestes a assinar, levava um "sopapo" na cabeça. "A toda hora mudavam o meu depoimento e me coagiam a assinar", disse. Ele se recusou a responder as perguntas do Ministério Público.
José Edson afirmou ter sido torturado com choques para admitir ter sido um dos autores dos disparos que mataram o político. "Me deram choques na boca, mãos e pés enquanto eu estava amarrado", disse. Ele foi o único dos três a responder perguntas da promotoria e negou inclusive conhecer qualquer um dos réus que eram julgados junto com ele.
Rodolfo admitiu conhecer os acusados da favela em que morava, mas negou qualquer participação no crime. Ele descreveu como teria sido submetido à tortura do pau de arara. "Me algemaram, colocaram os pés entre os braços, suspenderam e deram choques", afirmou. Ele mostrou aos jurados as supostas marcas de pancadas na testa que teria sofrido preso.
Questionados sobre por que o exame de corpo de delito não atestou a tortura, o trio afirmou que os exames realizados eram de "cartas marcadas". Os médicos legistas eram informados do crime que os suspeitos teriam cometido e atestavam não ter havido violência.
Crime político
Durante o julgamento, a promotoria irá sustentar a tese de que o crime foi motivado pela descoberta de enriquecimento ilícito por pivôs de um esquema de corrupção. A ação criminosa teria operado na administração municipal da cidade para financiar as campanhas políticas do Partido dos Trabalhadores, inclusive do então candidato à Presidência da República, Luiz Inácio Lula da Silva.
Sombra, que era amigo da vítima, teria encomendado a morte de Celso Daniel após descobrir o plano do prefeito de acabar com as fraudes em licitações e outros desvios de verba. "Ele conhecia esse esquema e, enquanto achou que servia apenas ao financiamento de campanha do Partido dos Trabalhadores, tolerava. Mas, quando soube que também enriquecia pessoalmente o grupo, passou a investigar", disse o promotor Márcio Augusto Friggi de Carvalho, em entrevista na quarta-feira.
Os demais envolvidos teriam sido contratados para, no jargão dos criminosos, "arquivar" o prefeito. No curso das investigações, sete pessoas ligadas aos fatos apareceram mortas em circunstâncias misteriosas, inclusive um médico legista que examinou o corpo da vítima. O juiz presidente do júri popular é Antonio Augusto Galvão de França Hristov.
A morte de Celso Daniel
As novas averiguações apontaram que a morte de Celso Daniel foi premeditada. As contradições entre as declarações de Sombra e as perícias feitas pela polícia lançaram suspeitas sobre o amigo do então prefeito. Ele havia dito que houve problemas nas travas elétricas do carro em que os dois estavam, que houve tiroteio com os bandidos e que o carro morreu. Mas a perícia da polícia desmentiu todas as alegações.
O MP denunciou sete pessoas como executoras do crime, sendo que Sombra foi apontado como o mandante do assassinato. Ele foi denunciado por homicídio triplamente qualificado - por ter contratado os assassinos, pela abordagem ter impedido a defesa da vítima e porque o crime garantiria a execução de outros. De acordo com o MP, o empresário fazia parte de um esquema de corrupção na prefeitura de Santo André que recebia propina de empresas de transporte, mas Celso Daniel teria tomado providências para acabar com a fraude, o que motivou a morte. Ele nega a acusação.
A Justiça decidiu levar todos os acusados a júri popular. Além de Sombra, José Edson da Silva, Elcy Oliveira Brito, Ivan Rodrigues da Silva, Itamar Messias Silva dos Santos e Rodolfo Rodrigo dos Santos Oliveira serão julgados pela prática de homicídio qualificado (por motivo torpe, mediante paga ou promessa de recompensa e por impossibilitar a defesa da vítima), cuja pena máxima é de 30 anos de reclusão. Em novembro de 2010 aconteceu a primeira condenação do caso: Marcos Roberto Bispo dos Santos pegou 18 anos de prisão em regime fechado.
***FRANCIS DE MELLO***
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